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O conceito de Maya

Atualizado: 22 de jan. de 2021

Maya, como todo conceito Indiano, tem diferentes interpretações e definições em função do momento histórico e da escola de pensamento que explora o conceito.



A definição mais antiga da palavra aparece no Rig Veda, considerado o mais antigo dos textos Indianos datado de tempos anteriores a 1600 A.C. Nesse texto, Maya é como um poder mágico que os deuses se utilizam para criar formas no mundo físico.


Neste artigo, vou analisar com mais detalhes duas visões propostas por duas escolas do pensamento Indiano, o Samkhya e o Advaita Vedanta.


Pelas lentes do Advaita Vedanta e a partir de outra classe de textos, os Upanishads, Maya é um conceito que se consolida a partir de AdiShankara, por volta do século VIII D.C.


A palavra, é em parte, sinônimo de ilusão e associada a uma grande força criadora.


Esta ilusão ocorre pelas formas de obter conhecimento de nós mesmos e do mundo através dos cinco sentidos, das memórias, da lógica e da inferência.


Estas formas são limitadas pelos filtros que se utilizam para criar a realidade que se projeta essencialmente como um eco interior do mundo exterior.


Assim, geramos continuamente uma falsa e ilusória percepção da realidade.


O mundo dual aqui nada mais seria do que um reflexo malformado da realidade última e não dual da consciência.


É como nossa imagem em um espelho. A imagem contém uma parte limitada do que realmente somos já que reflete apenas algo externo de nosso corpo e nada mais.


Porém, Shankara não revela, simplesmente, o mundo como uma ilusão e a realidade em si algo completamente diferente e assentada na visão não dual, onde a consciência é a única realidade.


Sua ponderação nos leva a entender algo como a realidade proposta em níveis nos quais há um último nível mais abrangente: a consciência unitiva, plena e além do tecido do espaço/tempo.


Seus ensinamentos também deixam claro que é através da dualidade que temos desejos e aí também o desejo de libertação do sofrimento, que leva o estudante e discípulo na busca de trilhar um caminho de autoconhecimento capaz de revelar nossa autêntica natureza.


Este processo ocorre quando a límpida consciência dentro de nós é refletida plenamente em nosso ego e personalidade.


Portanto, o desejo de libertação, a disciplina diária de autoanálise, meditação, o estudo dos textos através de um professor qualificado e toda ação voltada ao olhar interior ocorre a partir da dualidade, ou seja, de Maya.


Assim, negar Maya ou nosso ego como simplesmente ilusão, gera uma grande distorção no entendimento daqueles elementos tão importantes, duais e essências na jornada de libertação.


Quando caminhamos para fora do conceito de Maya do Advaita Vedanta, temos Prakriti ou a natureza em sua forma manifestada e não manifestada do Samkhya. Outra escola do pensamento Indiano.


Aqui o conceito é simples. Prakriti é tudo aquilo que se modifica com o tempo quando manifestada.


A diferença é que Maya, no Samkhya, é a ilusão de Purusha, nossa alma, que acredita ser o corpo e o eu. A natureza e toda a manifestação são consideradas tão reais como o Purusha, nossa alma individual.


Esta ilusão de sermos nosso corpo e mente é a causa do sofrimento dado que aquilo que se modifica com o tempo sempre acaba.


Nos identificarmos com qualquer elemento que sofra ação do tempo sempre leva a infelicidade, e, mesmo a alegria das conquistas, sempre passa.


Então, a busca pela revelação da consciência imutável, individual e perene, Purusha, é a libertação última do sofrimento. A alma que aprendeu a se desidentificar da natureza retorna a seu estado natural, livre e eterna.


Mas aqui também o ego, chamado de Ahamkara, nossa identidade transitória, é elemento essencial nesta busca. Tudo ocorre a partir dele, que é o degrau que utilizamos para chegar em Buddhi, aquele capaz de perceber que somos em essência muito mais que a natureza manifestada.


Assim, o Samkhya é um sistema de pensamento dual e qualquer uma das partes, seja a consciência ou a natureza, são reais.


E o Yoga, onde entra nesta história?


Primeiro, precisamos entender o Yoga não como um movimento único. São centenas de anos, diversas correntes desenvolvidas e novas em desenvolvimento.


O Yoga saiu já faz algum tempo da Índia e, onde quer que penetre no mundo, se funde com a cultura local, se moldando e em constante modificação.


Segundo, ao olhar para a história do Yoga, sabemos hoje de sua origem no movimento dos Shramanas na Índia de 500 a 700 A.C. que foi marcada por uma profunda conexão com o Samkhya, muito debatido neste tempo.


Então, o Yoga olha em sua lente mais antiga a realidade como dual. Tudo é real: seja o que sofre ação do tempo ou seja a consciência.


Terceiro, é que nos dias de hoje o Advaita Vedanta de Shankara é a escola de pensamento dominante na Índia e com grande crescimento no mundo. O que coloca Yogis e Yoginis em parte aderindo a não dualidade como natureza última e real.


Se você é um Yogi ou uma Yogini dual ou não dual entenda que esta é uma decisão sua e que em parte é moldada pelos seus professores, professoras ou mestres.


Mas, isso é o que menos importa. O mais importante é saber da importância de Maya.


Maya contém toda a dualidade, inclusive seus pensamentos, suas relações, seu esforço e vontade por amadurecer e se libertar. E a libertação virá a seu tempo.

No momento correto você será capaz de distinguir o que se modifica e o que não se modifica com o tempo dentro de você.


Descobrirá seu EU atemporal, gerador de sabedoria e que é capaz de transformar profundamente sua vida através de Maya.


Então, é através de Maya que vamos ao Yoga como estado de percepção da realidade. E é através do Yoga que moldamos nossa existência em Maya, transformando cada momento em um momento de eterno significado e amor.


Maya é a grande força de toda a manifestação. Maya é o caminho de retorno a quem realmente somos.




*Referências:


1. Ishvara Krishna: Samhkya Karika, tradução de Michael Douglas Neely

2. Swami Prabhavananda: Os Upanishads, Sopro Vital do Eterno, Swetasvatara Upanishad, Ed Pensamento.

3. H. Rodrigues: Maya – The Concepto of Ilusion, mahavidya.ca

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